
Mercado de Publicidade em Alerta: Agências e RHs Enfrentam Dilemas na Contratação de Talentos
O mercado publicitário, historicamente movido a criatividade e inovação, enfrenta hoje um paradoxo inquietante: nunca se exigiu tanto dos profissionais e das agências, e nunca foi tão difícil contratar. Em um cenário onde as transformações tecnológicas, a hiperconectividade e a demanda por resultados imediatos pressionam todas as pontas, o processo de recrutamento tornou-se um verdadeiro campo minado.
Excesso de perfis, escassez de encaixes
De um lado, temos uma geração inteira de profissionais recém-formados — ou até autodidatas — tentando entrar no mercado. Do outro, agências sobrecarregadas que buscam perfis híbridos, multifuncionais e prontos para performar desde o primeiro dia. A conta não fecha.
“Hoje buscamos um redator que também saiba fazer motion design, entenda de tráfego pago e domine ferramentas de IA. Isso assusta até quem já está no mercado”, comenta uma coordenadora de RH de uma agência digital paulistana. A exigência por profissionais multitarefas tem elevado o nível de exigência e, consequentemente, gerado frustrações em processos seletivos.
Salários defasados x expectativas elevadas
Outro ponto sensível é a defasagem salarial. Muitos candidatos entram nos processos com expectativas compatíveis com sua formação e bagagem técnica, mas se deparam com propostas incompatíveis com o custo de vida atual e a carga de responsabilidades exigida.
Além disso, a promessa de “visibilidade”, “ambiente criativo” e “oportunidade de crescimento” já não basta para convencer talentos em início ou meio de carreira. O discurso precisa vir acompanhado de estrutura, apoio psicológico e planos de carreira reais — algo ainda distante da realidade de muitas agências pequenas e médias.
A crise silenciosa nas agências
Por trás dos desafios do RH, existe uma tensão maior: o modelo tradicional de agência está em xeque. A aceleração digital exigiu mudanças de mentalidade que nem todas conseguiram acompanhar. Times enxutos, burnout criativo, prazos curtos e rotatividade alta compõem um cenário que dificulta não só a atração, mas também a retenção de talentos.
Segundo dados do CENP (Conselho Executivo das Normas-Padrão), houve uma queda no número de agências ativas entre 2020 e 2023, especialmente entre as de pequeno porte. Isso revela uma dificuldade crescente de se manter competitivo frente a influenciadores, plataformas de automação e até mesmo profissionais autônomos com boa presença online.
RH sob pressão: contratar ou sobreviver?
O setor de Recursos Humanos, por sua vez, vive um duplo desafio: encontrar talentos que atendam aos requisitos cada vez mais complexos e, ao mesmo tempo, oferecer condições humanas de trabalho. A pressa das agências em entregar resultados se reflete em processos seletivos apressados, onde muitas vezes se prioriza o portfólio em detrimento do potencial criativo ou do perfil comportamental.
“Temos recebido candidatos incríveis que são descartados por falta de experiência em uma ferramenta específica. Isso é um erro estratégico. Ferramentas se aprendem, mas criatividade e comprometimento são mais difíceis de formar”, afirma uma recrutadora especializada em marketing digital.
O que precisa mudar?
A solução para o desequilíbrio passa por uma revisão profunda da cultura de contratação e gestão nas agências. Valorizar talentos em desenvolvimento, oferecer treinamentos internos, flexibilizar critérios técnicos e repensar o modelo de entrega são caminhos possíveis.
Ao mesmo tempo, profissionais que desejam entrar ou se manter no mercado precisam entender que, mais do que técnica, o que se busca hoje é adaptabilidade, iniciativa e inteligência emocional.
Enquanto isso, o mercado segue em constante movimento — e as agências que não souberem recrutar com propósito correm o risco de perder a essência criativa que as sustenta.